O Ministério Público Federal em São Paulo (MPF-SP) expediu ontem (1°) um ofício à empresa Google solicitando informações sobre suposto favorecimento de resultados contrários ao chamado Projeto de Lei das Fake News (PL 2630/20), em discussão no Congresso Nacional.
No documento, o órgão cita um estudo realizado pelo NetLab, Laboratório de Estudos de Internet e Mídias Sociais da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), segundo o qual o Google – utilizado em 97% das buscas feitas por brasileiros –, estaria enviesando os resultados das pesquisas para favorecer links contrários ao PL 2630/20.
Em teste realizado pelo NetLab no dia 29 de abril, por exemplo, resultados de buscas pelo termo “PL 2630” tinham como primeiro resultado um link patrocinado pelo próprio Google cujo título se refere ao projeto de lei como PL da Censura, termo utilizado pelas plataformas contrárias à regulamentação.
Nos resultados orgânicos, sem impulsionamento pago, estariam sendo favorecidos, na primeira página de resultados, conteúdos hiperpartidários contrários ao projeto, acusa o monitoramento feito pelo NetLab.
Além disso, ao menos desde ontem (1°), a página inicial do Google exibe um link com os dizeres: O PL das fake news pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil. Ao clicar na frase, o usuário é remetido a um artigo da própria empresa com críticas ao projeto.
O MPF reconhece ser legítimo o debate e as críticas ao projeto feito pela empresa, mas alerta que a manipulação em resultados de buscas sobre o assunto, como uma forma de enviesar o debate público, pode configurar abuso de poder econômico.
“Esse tipo de prática, se confirmado, parece estar fora do âmbito de condutas que sujeitos alvo de propostas de regulação podem adotar em um debate democrático. Afinal, trata-se, aqui, não da participação pública e transparente em uma discussão regulatória em curso (por meio, por exemplo, de reuniões e conversas com parlamentares, de publicação de artigos em jornais e revistas, e de publicidade declarada como tal, perante a população), mas sim do uso, por plataformas potencialmente afetadas, dos meios que elas controlam, com exclusividade, para impulsionar, de forma opaca e escapando de qualquer accountability, a percepção que lhes interessa sobre um tema de inegável importância pública”, escreveu o procurador Yuri Corrêa da Luz, que assina o ofício.
O MPF também quer explicações sobre alertas enviados a influenciadores digitais na plataforma YouTube, que estariam sendo estimulados a se posicionar contra o PL 2630, sob o suposto risco de perderem em monetização de seus canais na plataforma.
Outro ponto questionado foi o fato de que a empresa Meta, responsável por redes sociais como Facebook e Instagram, estaria veiculando anúncios pagos pelo Google com conteúdos contrários ao PL 2630, mas sem identificar tratar-se de conteúdo com teor político. A procuradoria deu prazo de 10 dias para que o Google e a Meta expliquem os pontos destacados pelo NetLab.
Ontem à noite, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, disse que iria acionar a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacom) para apurar eventual abuso de poder econômico pelas empresas.
O PL das Fake News tem previsão de ser votado nesta terça-feira (2) no plenário da Câmara, mas para ser pautado ainda depende de uma deliberação na reunião de líderes partidários, em que é definida a pauta de votação.
Outro lado
A Agência Brasil tenta contato com a empresa Meta para comentar o ofício enviado pelo MPF-SP. Ao ser contactado, o Google negou a prática de manipulação de resultados e disse que as críticas ao projeto de lei são legítimas. Confira abaixo a íntegra da nota da empresa.
“As alegações de que estamos ampliando o alcance de páginas com conteúdos contrários ao Projeto de Lei 2630 na Busca, em detrimento de outras com conteúdos favoráveis, são falsas. Cada vez que uma pessoa faz uma busca, nossos sistemas trabalham para mostrar para ela os resultados mais relevantes entre milhares, às vezes milhões, de páginas de web. Não alteramos manualmente as listas de resultados para determinar a posição de uma página específica em nenhuma hipótese. Nossos sistemas de ranqueamento se aplicam de forma consistente para todas as páginas, incluindo aquelas administradas pelo Google.
Acreditamos que a discussão sobre uma legislação que pode impactar a vida de milhões de brasileiros e empresas precisa ser feita envolvendo todos os setores da sociedade. Nas últimas semanas, temos nos manifestado em relação ao PL 2630 de forma pública e transparente por meio de nosso blog oficial. Além disso, temos investido em campanhas de marketing para dar visibilidade mais ampla às nossas preocupações, por meio de anúncios em veículos de comunicação tradicionais, como jornais, e em mídia digital, incluindo nossas plataformas de publicidade e redes sociais.
Temos explicado os riscos, que consideramos legítimos, às pessoas que usam nossas plataformas e também aos diferentes participantes do ecossistema digital. Isso inclui criadores de conteúdo no YouTube, anunciantes de todos os tamanhos e sites de notícias. Às vésperas da votação do PL 2630, que não foi discutido tão amplamente e sofreu alterações significativas nas últimas semanas, é importante que os brasileiros estejam informados sobre os possíveis impactos para tomarem uma decisão sobre como participar dessa discussão.” (As informações e foto são da Agência Brasil)